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Grande Ilha

Demos a volta completa na Ilha Grande, saindo de Angra dos Reis, em cinco dias
Rio que deságua as lagoas das Praias Sul e Leste, no lado mais preservado da Ilha Grande
Lagoa Azul

Brooke Shields e Christopher Atkins viajaram até a­ Jamaica para gravar o filme Lagoa Azul, mas poderiam, muito bem, ter ido à Ilha Grande. Pelo menos é o que pensavam os moradores da ilha na década de 1980. Foi logo após o lançamento do filme que resolveram mudar o nome da Praia do Sul de Fora para Lagoa Azul. E o nome pegou! Hoje é o principal ponto turístico da região. Durante o verão, a atração fica apinhada de barcos, lotados de turistas. Todos querem conhecer a lagoa que os moradores juram ser mais bonita que a do filme. E pude constatar que realmente é um lugar fora do comum, um passeio imperdível. Por isso resolvemos começar nossa circum-navegação ali.

A Lagoa Azul da Ilha Grande ganhou esse nome depois do lançamento do filme homônimo na década de 1980
Saída de Angra dos Reis

Saímos com o sol nascendo de Angra dos Reis, atravessamos o canal e chegamos na Lagoa Azul antes das 8 horas da manhã. Nesse horário ainda não há turistas, então ficamos com o espaço todo só para a gente. Logo vimos muitas tartarugas e peixes coloridos. A água é incrivelmente transparente.

O pedaço que fica entre duas ilhas (Comprida e Redonda) é o mais impressionante. Lá existe apenas uma casa. Quem vive ali é um pescador nativo, de uns sessenta anos de idade. Seria o típico caiçara, se não fosse o cabelo tipo moicano e o fato de se autodenominar Thor. Um figura que nos recebeu em “sua ilha”, ofereceu água e se interessou muito pelo nosso projeto. Nunca tinha ouvido falar de alguém que tivesse feito esse percurso em cima de uma prancha. Então contei para ele como tudo começou.

Angra dos Reis, no dia que saímos para dar a volta na Ilha Grande
Como o projeto começou

Em setembro do ano passado, uma seguidora do Instagram, me escreveu pelo site (www.caminhosdosup.com.br), pedindo informações sobre a Ilha Grande. Estava pensando em dar a volta completa nela, remando de stand up paddle (SUP). Respondi que não conhecia a ilha tão bem assim, mas que era meu sonho fazer essa volta. Se ela esperasse até janeiro poderíamos fazer juntos. Ela topou na hora e ainda incluiu o irmão no grupo. Passamos meses planejando. Onde dormir, o que comer, o que levar. Fui acompanhando a direção do vento e das ondas dia a dia, para decidir se faríamos o percurso no sentido horário ou anti-horário. Enfim, dividimos o trajeto em cinco, dando uma média aproximada de 25 quilômetros de remada por dia. Nos lugares que houvessem pousadas, dormiríamos em pousadas, para onde não tivesse eu estava levando uma rede de nylon e eles levavam sacos de dormir. Com a comida era a mesma coisa: onde tivesse restaurantes, comeríamos nos restaurantes, para onde não tivesse estávamos com enlatados, barras de proteína e géis de carboidrato. Além disso, levamos pílulas de cloro que prometem deixar qualquer água doce potável.

Roupas e outras coisas que não podiam molhar (como o drone para as fotos, por exemplo) estavam acondicionados em sacos estanques. O resto, levávamos em mochilas tradicionais mesmo, tudo preso às pranchas por elásticos náuticos.

Remando na Ilha Grande, RJ
Lagoa Verde

Depois de tanta conversa, resolvemos remar direto até a Praia Longa, sem paradas no caminho. Lá almoçamos e tomamos um revigorante banho de cachoeira. Com as baterias recarregadas continuamos até outra grande atração da ilha, a Lagoa Verde. Era final da tarde e já não tinham tantos turistas ali. Encostamos as pranchas num bar flutuante (o único) e ficamos apreciando a vista enquanto conversávamos com o dono do bar. Ele era estrangeiro, com pinta de agente da KGB, falava um português arrastado nas consoantes e com a cadência de um militar. Mas quando soube dos nosso planos, disse que era muito perigoso, que estávamos fazendo no sentido errado, que entraria um vento forte nos próximos dias e nós seríamos arremessados contra as pedras ou levados na direção da África. Ele mostrou planilhas no celular, entrou no site da marinha, fez de tudo para que desistíssemos da aventura. Mas estava tudo muito bem planejado. Segundo minha pesquisa, o tempo ficaria bom nos cinco dias de remada. Não havia o que temer. Por educação dissemos que iríamos considerar a partimos rumo à Praia de Araçatiba, onde passamos a primeira noite.

O coqueiro mais famoso do Brasil, na Praia do Aventureiro, onde passamos a segunda noite
Segundo Dia

O segundo dia começou com a visita à Gruta do Acaía. Depois de amarrar as pranchas, subir as pedras e entrar alguns metros na mata, achamos a entrada da caverna. Fomos nos arrastando pelo caminho estreito e completamente escuro até que a caverna se abriu num enorme salão. Lá no fundo dava pra ver a água do mar que, por causa de um raro fenômeno ótico, tem a cor verde fluorescente. Com o equipamento adequado, cilindro de oxigênio e tal, dá para entrar naquela água, nadar alguns metros e chegar no mar aberto. Sempre da gruta para o mar e nunca no sentido contrário, porque assim a luz do dia serve de guia.

Enquanto nos preparávamos para voltar a remar, recebemos a visita de um enorme peixe-espada. Tinha quase um metro e meio de comprimento e ficou alguns minutos ali, aparentemente sem temer nossa presença. E esse foi só o começo. Depois vimos peixes-voadores, cardumes com literalmente milhares de peixes, tartarugas, caravelas e golfinhos, muitos golfinhos. Foi quase chegando na Praia do Aventureiro (nosso destino final naquele dia), que eles apareceram. Nunca tinha visto tantos juntos. Eles passavam por todos os lados, inclusive embaixo da prancha. Foi uma experiência incrível, inesquecível.

Praias Sul e Leste e a lagoa onde nenhum ser humano pode entrar
Coqueiro famoso

Acordamos animados para o terceiro dia na Praia do Aventureiro. Remaríamos o tempo todo no lado da ilha voltado para o oceano. Apesar do mar mais agitado e do vento forte, o cenário compensa o esforço. Quase toda essa parte é reserva florestal e um pedaço é reserva biológica (onde nenhum humano pode entrar). A natureza ali é super bem preservada e, por isso, é o lado mais bonito da Ilha Grande.

Antes de sair, fizemos a parada obrigatória no coqueiro mais famoso do Brasil. Na alta temporada, as pessoas fazem fila para tirar selfies ao lado dele. Eu juro! É que o coqueiro nasceu deitado e faz uma curva de noventa graus, bem em cima da praia. Uma coisa linda mesmo, que os turistas querem registrar.

Seguimos até as praias Sul e Leste, as mais preservadas de toda a ilha. Lá tem duas lagoas enormes que, vistas nas imagens de satélite, parecem dois pulmões. Sempre quis remar nelas mas a visita é proibida, por fazerem parte da reserva biológica. Então, seguramos o impulso de invadir e remar mesmo assim, e me contentei em mandar o drone para ver tudo na telinha.

As Praias Sul e Leste são desertas e selvagens, fazem parte de uma Reserva Biológica

De volta às pranchas, remamos por um longo trecho sem praias, só com o paredão de pedras e a mata densa. Da água conseguíamos ouvir o ronco dos bugios. O som dos macacos foi nossa única companhia até a Praia de Dois Rios, onde passamos a noite.

Praia de Dois Rios, onde passamos a terceira noite, dormindo em redes

 

Nascer do sol na Praia Dois Rios, na Ilha Grande – RJ
Quarto dia

Acordamos com o céu vermelho, antes do sol nascer. Enquanto tomávamos o café da manhã o sol apareceu bem na nossa frente, no meio do oceano. Foi um festival de cores e tons, difícil de capturar nas fotos.

Acordado pelo sol, depois de uma noite de sono na rede
Cachadaço e Lopez Mendes

Seguimos viagem, agora sentindo a força contraria do vento com mais intensidade. Vimos novamente um grupo de golfinhos um pouco antes de chegar na Praia do Cachadaço. Lá estava um grupo de argentinos que moram na ilha. Eles pulavam de uma pedra bem alta na costa, mergulhando no mar. Depois contamos a eles o que estávamos fazendo e eles nos falaram que já fizeram o mesmo, só que em caiaques oceânicos. Ficaram impressionados com a nossa disposição, ainda mais com aquele vento. Nunca souberam de ninguém que tenha dado a volta completa na ilha de SUP. Então resolvemos ali, que, até que provem o contrário, somos os primeiros a fazê-lo. Nos despedimos e continuamos remando. Passamos rapidamente por Lopez Mendes, a famosa praia dos surfistas. Não queríamos perder tempo, porque o vento estava cada vez mais forte e logo estaríamos no lado abrigado da ilha.

Moradores da Ilha Grande ma Praia do Cachadaço

Antes de passar a ponta de Castelhanos ainda vimos golfinhos outra vez. Remamos 29 km nesse dia e ficamos esgotados, mas conseguimos chegar em Abraão, a maior vila da Ilha Grande. Foi bom estar de voltar à civilização, tomar banho quente, dormir com ar condicionado, descansar enfim.

Navio da MSC em Abraão, o “centro” da Ilha Grande
Fim da Remada

O último dia de remada foi bem mais curto e o menos bonito dos cinco. Passamos pertinho de um enorme navio de cruzeiro. O trânsito de lanchas, escunas e taxi boats era intenso. E, infelizmente, vimos muito lixo também. Demos uma última conferida na Lagoa Azul e partimos de volta a Angra dos Reis. A chegada foi muito comemorada e fui tomado por uma euforia que há muito não sentia. Tínhamos conseguido! Paramos então para lembrar de cada momento que passamos e principalmente de cada pessoa que conhecemos. Ficamos impressionados com a solidariedade de todos. Muitos nos ajudaram, as vezes com palavras de incentivo, outras oferecendo água e comida. Esse apoio foi fundamental para o sucesso da aventura. Obrigado!

Dia 1
Dia 2
Dia 3
Dia 4
Dia 5
DADOS DA TRAVESSIA DE SUP NA ILHA GRANDE

Distância = dia um 25 km / dia dois 23 km / dia três 21 km / dia quatro 29 km / dia cinco 18 km

Duração = 5 horas e meia / 4 horas e meia / 4 horas e meia / 5 horas e meia / 3 horas

Condições = variaram bastante mas, nos últimos dois dias, pegamos ventos muito fortes

Cidade = Ilha Grande, Angra dos Reis – RJ

 

COMO CHEGAR NA ILHA GRANDE

Remando: Saindo de qualquer lugar da costa de Angra dos Reis

De Barco Particular: Procurar barqueiros locais no porto de Angra dos Reis e Mangaratiba

De Embarcação Pública: Todos os dias, várias saídas em horas marcadas de Angra dos Reis e de Mangaratiba

 

ALUGUEL DE SUP

Muitas praias têm pranchas de Stand Up Paddle pra alugar. Na vila de Abraão há mais variedade.

 

Texto e fotos: Daniel Aratangy

2 Responses

  1. Parabéns pelo conteúdo do site não existe outro igual pelo menos em português conheci através do instagram, em Dezembro vou fazer uma trip 5 dias Ilha Grande e 4 Ubatuba vou levar dois Sups, estou pegando algumas dicas. Sou de Mongaguá Litoral de Sp. Obrigado por dividir fotos e momentos como esses. Bruno

    1. Oi, Bruno.
      Muito obrigado pela mensagem! É super importante receber esse retorno. Valeu mesmo!
      E cara, essa viagem vai ser demais hein. Aproveita lá!
      Não esquece de ir na Lagoa Azul (na Ilha Grande) bem cedo. Se não vc vai ficar remando na muvuca.

      Boas remadas!

      Abraço, Daniel

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